Rio -  Morro do Borel, Tijuca, Zona Norte de um Rio de Janeiro sob temporal, dez da noite. Neste ambiente há pouco tempo considerado de risco, representantes do poder público e da comunidade discutiram o tema moradia nas favelas e chegaram a uma conclusão: o maior problema é a falta de diálogo entre o poder público e os moradores do morro.
Da esq para a dir, Aziz Filho, Jovino Neto, Dalcio Marinho, Francinete Louro, Pedro da Luz e Antônio Augusto | Foto: Fernando Souza / Agência O Dia
Da esq para a dir, Aziz Filho, Jovino Neto, Dalcio Marinho, Francinete Louro, Pedro da Luz e Antônio Augusto | Foto: Fernando Souza / Agência O Dia
A convite do DIA e do jornal Meia Hora, Antônio Augusto Veríssimo, da Secretaria Municipal de Habitação, o vice-presidente do Instituto dos Arquitetos do Brasil Pedro da Luz Moreira e o geógrafo Dálcio Marinho debateram durante três horas com o líder da ONG Jocum Borel, Jovino Neto, e a do Centro Cultural Roda Viva, Francinete Louro, ideias e soluções para a questão, tema do terceiro seminário “Rio — Cidade sem Fronteiras”, promovido pelo Grupo Ejesa na terça-feira.
“A imprensa passou anos e anos olhando para as favelas com o enfoque da violência, tratando apenas da questão da segurança pública e esquecendo todo o resto. Chegou a hora de a gente começar a reparar esta falha e tratar dos outros problemas, como fazemos no asfalto”, explicou Aziz Filho, editor-chefe do DIA e mediador do debate no Borel.
Ao fim do evento, representantes da favela e do asfalto concluíram que a questão habitacional é marcada por uma histórica falta de diálogo entre as partes.
“As favelas do Rio diferem das outras porque estão e sempre estiveram integradas à cidade. Não é como em São Paulo, por exemplo, onde elas se espalham apenas pelas periferias. Aqui, temos favelas em Ipanema, Copacabana, Tijuca, em todas as áreas. É preciso ouvir os moradores porque, afinal, são eles os clientes”, explicou Antônio Augusto, da secretaria de Habitação.
Moradores do Borel ocuparam todos os espaços para participar do seminário ‘Rio — Cidade sem Fronteiras’: atentos a cada comentário no debate | Foto: Fernando Souza / Agência O Dia
Moradores do Borel ocuparam todos os espaços para participar do seminário ‘Rio — Cidade sem Fronteiras’: atentos a cada comentário no debate | Foto: Fernando Souza / Agência O Dia
Anfitrião do encontro, Jovino Neto, da ONG Jocum, ressaltou a importância do diálogo entre moradores e autoridades para que os investimentos e habitação não se percam com o tempo.

“Represento a comunidade e sei do nosso papel neste debate. Não é apenas cobrar cada vez mais das autoridades, mas também fazer a nossa parte. Penso que a responsabilidade é dividida: 50% para o governo e 50% para a comunidade, que tem que cobrar e cuidar do que é nosso”, defendeu Jovino.
Moradores lotam auditório
Os moradores do Borel marcaram presença no seminário “Rio — Cidade sem Fronteiras”, promovido pelo Grupo Ejesa, e lotaram o auditório da ONG Jocum, vizinho à localidade conhecida como Terreirão.
A presença de autoridades fez com que eles pudessem fazer seus questionamentos e queixas publicamente, sem intermediários, o que motivou a presença do público.
“Quis mostrar a cara porque favela sempre foi muito bom para político vir aqui, tirar foto da miséria, ir lá fora e pedir dinheiro. A pobreza aqui no morro e a falta de moradia digna viram camarão na mesa dos bacanas do asfalto”, protestou o morador Maciel Pinheiro.
Promessa de urbanização
Arquiteto urbanista formado pela UFRJ, Antônio Augusto Veríssimo é funcionário da Secretaria Municipal de Habitação desde sua criação, em 94. Acompanhou, de perto, todos os projetos realizados. Hoje é coordenador de Planejamento e Projetos da secretaria.
“O Rio já teve o Projeto Mutirão, o Pró-Sanear, o Favela-Bairro e ainda há muita coisa a fazer, sobretudo quanto à metodologia de trabalho. Ainda temos muitos problemas”, admite.
O arquiteto está otimista quanto ao planejamento da prefeitura, que prometeu urbanizar todas as favelas da cidade até 2020. “Posso garantir que, se conseguirmos os recursos necessários, será possível”, avalia. E o investimento, segundo ele, já está orçado dentro do programa Minha Casa, Minha Vida, do governo federal.
‘Será que o PAC vê a gente?’
Francinete Silveira Louro, a Fran, chegou à ONG Roda Viva em 1998 para participar de uma pesquisa relacionada ao fornecimento de energia elétrica nas comunidades — e nunca mais deixou o grupo.
Concluiu o Ensino Fundamental, depois o Ensino Médio, fez vestibular e tornou-se pedagoga, líder da instituição e defensora dos direitos sociais nas comunidades carentes.
Entusiasmada com o evento, ela pediu para os moradores exercerem sua cidadania, marcando presença, fiscalizando de perto as ações do poder público para que os investimentos tragam, de fato, o retorno desejado para a população das favelas. “Fala-se muito em obras, mas nunca o morador é ouvido. É preciso discutir para saber se o governo entende nossas necessidades”.