Rio -  Durante 16 anos de carreira, a relação de Taís Araújo com a crítica especializada foi a maior parte do tempo tranquila. Desde a sua primeira protagonista em “Xica da Silva” até a empregada doméstica Maria da Penha da novela “Cheias de Charme”, a atriz conseguiu manter currículo cheio de acertos e elogios e se tornou uma das principais estrelas da sua geração ao assumir o papel da primeira protagonista negra da TV Globo em “Da Cor do Pecado”.
Taís Araújo viverá heroína nada convencional em 'O Dentista Mascarado' | Foto: Divulgação
Taís Araújo viverá heroína nada convencional em 'O Dentista Mascarado' | Foto: Divulgação
Mas nem sempre foi assim. O ápice de sua carreira, em 2009, quando foiconvidada pelo novelista Manoel Carlos para interpretar a primeira Helena negra de sua ficção, em “Viver a Vida”, veio também acompanhado de muito sofrimento. “Eu fui espinafrada! Foi um processo superdoloroso. E demorou para as feridas cicatrizarem”, lembra.
O papel que coroaria sua carreira se tornou o trabalho mais difícil e criticado negativamente. E foi exatamente devido a esta experiência traumática que Taís topou imediatamente o desafio do autor teatral Jô Billac , que queria fazer um espetáculo sobre o universo da crítica.
Em cartaz no Rio, a peça “Caixa de Areia” conta a história de uma critica de arte que vê a vida como se estivesse fora dela, incapaz de se envolver afetuosamente com alguém, com seu olhar crítico a respeito de tudo e todos. No elenco, além de Taís, estão Luiz Henrique Nogueira , Cris Larin, Julia Marini e Jaderson Fialho.
No camarim do teatro Sesi, a global falou sobre sua carreira e a série cômica ainda inédita “O Dentista Mascarado”, pediu a saída do deputado Marco Feliciano da Comissão de Direitor Humanos da Câmara de Deputados e revelou seus planos para aumentar a família com o ator Lázaro Ramos. “Tô tentando. No tempo vago é isso que eu faço. (risos) Uma hora vai acontecer”, diverte-se.
Ao fim da apresentação de seu espetáculo “A Caixa de Areia”, é fácil ouvir o público comentando sobre como você está diferente da TV. Foi por isso que você quis fazer este texto?
Taís Araújo: Na verdade, procurei o Jô Billac porque ele é um ótimo autor e porque tem um processo de criação muito diferente do que faço na televisão. Ele constrói o texto a partir do que o ator dá para ele. É algo artesanal. Não é um trabalho fácil porque todo mundo tem voz ativa e, quando se tem essa liberdade, vira um caos. Mas é um trabalho autoral e isso tem um valor grande. Quando ele disse, então, que queria falar sobre crítica, fechei na hora.
Por quê? 
Taís Araújo: Essa peça faz parte de uma trilogia dele: “Savana Glacial” fala sobre a inspiração do autor, “Popcorn” sobre a autenticidade do texto e “Caixa de Areia” sobre crítica. E eu também quis falar sobre isso. Tenho uma carreira de 16 anos na televisão e já lidei com as críticas de tudo quanto é jeito. Já me fez mal, já me fez bem, já tentei ignorar... Às vezes dá para absorver algo, mas algumas pessoas só querem te colocar para baixo. Você vê que tem de tudo e vai amadurecendo, inclusive, com as críticas.
Com quais críticas você mais sofreu? 
Taís Araújo: Sem dúvida alguma foi fazendo a Helena de Manoel Carlos. Eu fui espinafrada! Foi um processo superdoloroso e doído. Mas, quando passou, vi que todo esse sofrimento me fez melhor atriz e pessoa. E foi um papel que demorou para passar, para as feridas cicatrizarem... Ter conseguido passar por este desafio foi sensacional. Por isso, quando o Jô falou que queria falar sobre crítica, topei na hora. O que vivi por Helena foi algo transformador.
Sua personagem na trama é uma mulher que fala o que pensa. Isso é uma qualidade ou defeito? 
Taís Araújo: Quando se fala de maneira impulsiva, beiramos o defeito porque não se mede as consequências. Falar tudo que se pensa é uma imaturidade ou quase uma ingenuidade, no pior sentido da palavra. Porque a pessoa vive numa sociedade e, ao falar qualquer coisa, pode desrespeitar o outro. Aí tentam justificar: “Não sou demagoga”. Isso não é demagogia ou ética! É saber que ela está em uma sociedade.
Em uma entrevista, você disse que sofreu preconceito no início da sua carreira. Como avalia o cenário atual? 
Taís Araújo : O preconceito continua aí e vai continuar porque está na nossa cultura. É claro que tem melhorado muito, que há mais oportunidades. Mas não posso falar que melhorou 100% porque estaria mentindo. Meu filho vai crescer e ainda vai encontrar um país preconceituoso e ter dificuldades por aí.
Como vai conversar com ele sobre isso? 
Taís Araújo: Vou conversar e prepará-lo como profissional para encarar o mercado de trabalho de maneira potente. Quero que ele seja um profissional completo para poder competir de igual por igual. Mas isso é o meu filho, né? Tenho condições de botar ele em um bom colégio, para estudar línguas. E é aí que você vê o grande preconceito desse país. Meu filho, infelizmente, é uma exceção. Se, pelo menos, 15% da população tivessem as mesmas oportunidades que ele tem, as coisas iam começar a melhorar. Até acredito que isso está aumentando. Há políticas afirmativas que estão ajudando a melhorar.
Você é uma mãe liberal? 
Taís Araújo: Não. Desde bebê, o Jovi tem uma rotina regrada. Isso faz parte e acho que a criança gosta também. Nós também já colocamos limite nele. Claro, o limite possível para uma criança de um ano e nove meses. Ele está começando a nos testar. E é nesse momento que ele tem de saber que nem tudo ele vai conseguir. Mas, também não sou durona, assim. Quero ter uma relação de diálogo com ele.
No ano passado, você disse que queria ter outro filho... 
Taís Araújo: Tô tentando. No tempo vago é isso que eu faço. Prometo (risos). Uma hora vai acontecer.
Na peça, sua personagem tem uma relação desrespeitosa com o marido. Como você e Lazáro mantêm a liberdade no casamento? 
Taís Araújo: Minha personagem é fruto da mulher da década de 50. Vivia para a família, mas internamente tinha um desejo de liberdade paradoxal com a vida que ela tinha construído. Vivemos de outra maneira hoje. Trabalho tanto quanto o meu marido e tenho uma vida tão próspera quanto à dele. Mas, se existir alguma receita para um relacionamento é ter diálogo e respeito, basicamente. Com isso, você vai levando. Claro, temos nossos defeitos e percalços, como qualquer casal. Mas com respeito e conversa a gente se resolve.
Você está no elenco da série “O Dentista Mascarado”. Como está sendo explorar o seu lado cômico? 
Taís Araújo: Me sinto na base da cadeia alimentar da comédia! (risos) Estou me divertindo muito. Quando estou indo trabalhar, parece que vou para o recreio do colégio. Se eu tinha qualquer pudor, relacionado a qualquer coisa, tive de perder. O texto da Fernanda (Young) e do Alexandre (Machado) é amoral, tem liberdade. E a personagem é assim. Tem de tudo: desde me vestir de freira para dar um golpe até alguém mordendo minha bunda. Conquistei, nessa série, coisas que uma pessoa não conquista a carreira inteira. Estou falando de coisas bagaceiras, sabe? (risos) Fico brincando que ninguém vai me respeitar mais.
Isso te preocupa? 
Taís Araújo: Não. De jeito nenhum. É essa diversidade que procuro na minha carreira. Claro, faço a dramaturgia clássica da novela. Mas dá uma liberdade pegar o pudor e jogar na janela. E estou aprendendo muito. Tenho conquistado, nessa série, uma liberdade que nunca tive.
Você tem muitas cenas de lingerie na série. No ano passado, durante gravação de “Cheias de Charme”, publicaram fotos suas de biquíni e falaram sobre celulites... 
Taís Araújo: Tô nem aí para isso! Acho que estou no lucro porque tive um filho e consegui emagrecer (risos). Pensei que ia ficar gorda para sempre. Porque minha família é assim. Também uso coisas que valorizam meu biotipo, né? Não sou boba (risos). Sempre uso roupas decotadas, que deixem o ombro de fora, porque ele é magro. Estou fazendo capoeira, mas não é nem pelo papel. Estava sem malhar desde a gravidez do Jovi . Ele adora, vai comigo, fica me imitando, corre de um lado para o outro.
E o cabelo curto? Queria radicalizar?
Tais Araújo: Eu sempre quis ter cabelo curto. Adoro. É uma liberdade. Com cabelo curto, você explora mais outras partes do corpo. Você coloca um ombro de fora, um pescoço de fora e fica bonito. Ai... não queria deixar crescer. Mas, se tiver de deixar, para alguma personagem, tenho certeza que depois dos meus 50 anos vou passar a tesoura novamente. Vou manter minha maturidade com cabelo curto.
Você e Lázaro são artistas politizados e você, em vários de seus personagens, levantou bandeiras. O que achou da indicação de deputado Marco Feliciano para chefiar a Comissão de Direitos Humanos? 
Taís Araújo: Esse cara não me representa! Nem como mulher nem como cidadã. Isso tem de ser dito. Tudo que ele fala é baboseira. Não comungo com nenhuma opinião e ideia dele. Realmente, não gostaria que ele ocupasse esse cargo. Mas, pelo menos, tenho visto acontecer algo muito bonito no nosso país.
O quê? 
Taís Araújo: A gente está se movimentando. E acho que as redes sociais são muito importantes nesse sentido. Temos que atingir o máximo de pessoas possíveis, levantar a voz e falar que não queremos esse cara lá. Acho que desde o impeachment do Collor é o momento em que mais vejo o povo falando o que quer. E isso tem de ser respeitado. Temos que conhecer nossos direitos: quantos milhões de assinaturas são necessárias? Vamos fazer isso. E temos que cobrar.

As informações são de Luisa Girão, do iG