terça-feira, 11 de junho de 2013

Milton Cunha: Moralismo falso

Milton Cunha: Moralismo falso

Precisamos reconhecer em nós a incompletude, sem acreditar nesta balela de que é preciso ser bom o tempo inteiro

O DIA
Rio - Um dia a minha hora vai chegar? Imaginem eu liderando um boicote porque o vilão da novela é bicha-má? Será que eu acharei que só tem bicha boa no mundo? E que a partir de um personagem, os que assistem a novela vão achar que todos nós gays não prestamos? Vejo ex-chacrete tentando demonizar Rita Cadillac por ter feito filme-pornô ou deixar presidiários passar a mão em seu bumbum, pregando uma vida virtuosa nos moldes da moral totalitária e excludente, que as condenavam. Parece que o povo vai envelhecendo e, com a proximidade de um possível acerto de contas com o Criador, usam suas ultimas décadas em contrição, preparando-se para entrar no paraíso (e precisam ser perdoados dos excessos da juventude, porque o arrependimento tardou mas não falhou). Uma galera que foi jovem nos 60 e 70, aquelas décadas do faça amor livre não faça a guerra, da liberação feminista, das drogas, dos hippies, do Chacrinha falando do Pepino da Maria Bethânia!
“Minha dor é perceber, que apesar de termos feito tudo, tudo o que fizemos, ainda somos os mesmo e vivemos como nossos pais”: a líder chacrete diz que os filhos dela frequentam faculdades, são respeitáveis profissionais, e se envergonham de ver a classe retratada de maneira negativa por Walcyr Carrasco no ‘Amor à Vida’. Logo elas, libertários símbolos de uma mulher que podia rebolar de maiô enfiado, sem que isto significasse prostituição. Era artístico, mas também santas não eram. Estavam viva, gostosas, e podiam fazer de seus corpos o que bem entendessem. Vedetes pós-modernas, muitas estudavam, discursavam sobre a pílula e as cantadas machistas que recebiam: deusas desejadas, forjavam a garota antenada e dona de seu nariz, ‘prafrentex’ como se dizia na época.
O tempo passou e muitas ‘livres’ tornaram-se vozes da respeitabilidade que nunca as respeitou: inimigas donas de casa, típicas representantes da tradição, família e propriedade, sempre tiveram certeza que todas as rebolativas eram pistoleiras. Certamente tinham as que não prestavam, mas sempre tive a impressão de que a maioria delas seguravam as pontas. Me parece que agora quando julgam Rita, qualificando-a de menor, “outra coisa”, a vidraça virou pedra. Melhor seria conversar sobre esta necessidade de sempre apontar para os outros: precisamos reconhecer em nós a incompletude, o anjo e o demônio, sem acreditar nesta balela de que é preciso ser bom o tempo inteiro. Falhos, desejando visibilidade, somos casa de ferreiro, espeto de pau.
E-mail: chapa@odia.com.br

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