Leda Nagle: Sem clima
Rio - Quanta falta de responsabilidade, não? Quase todas as cidades do país correm atrás do prejuízo e num surto de legalidade fecham casas noturnas que oferecem perigo e ameaçam a vida de seus frequentadores. Só depois da tragédia de Santa Maria é que se descobriu tantas ilegalidades?
Antes, todo mundo sabia e ninguém se importava ou todo mundo contava com a boa vontade de Deus e de todos os santos para que nada acontecesse? Nunca se fez tanta vistoria, nunca se fechou tantas casas. Aliás, talvez fosse mais conveniente perguntar quem tem este documento raro, chamado de alvará.
Será motivador criar um selo de qualidade para quem anda de bem com a lei? E falando em leis ou pensando nelas, a gente se pergunta por que é que temos tantas leis, dizem até que são muito bem feitas, e não conseguimos cumpri-las? Porque temos uma porção rebelde que nos faz antagonistas delas ou as ignoramos como crianças mimadas teimam em não obedecer aos pais ou aos professores? Ou por que nos achamos acima das regras? Ou será que driblar as leis dá uma espécie de prazer, uma sensação de poder que só os psiquiatras poderão explicar?
Lendo as cartas de leitores dos jornais ou os milhares de comentários das redes sociais, fico estarrecida ao perceber que quase todo mundo acha que daqui a dois, três meses, ninguém mais vai se lembrar dos alvarás, das portas de emergência, dos revestimentos das paredes das boates ou de restaurantes, bares ou sei lá o quê. Todo mundo acha que é uma onda e vai passar. E por que é que tanta gente acha isto? Porque o Bateau Mouche passou e ninguém está preso, porque o caso do bondinho de Santa Teresa caiu no esquecimento, por que o caso do Morro do Bumba, em Niterói, também ficou sem punição e em outras partes do nosso Brasil isto também aconteceu e acontece?
Por que, de verdade, daqui a pouco tempo, vai ter gente que vai criticar quem falar de Santa Maria, quem se lembrar com tristeza daqueles jovens numa roda de conversa. A pessoa vai ser tachada de chata, baixo astral e vai correr o risco de ter a palavra cassada para não estragar o prazer alheio. Vou lembrar aqui o poema ‘Despertar é Preciso’, de Eduardo Alves da Costa: “Na primeira noite eles aproximam-se e colhem uma flor do nosso jardim e não dizemos nada.
Na segunda noite, já não se escondem; pisam as flores, matam o nosso cão, e não dizemos nada. Até que um dia o mais frágil deles entra sozinho em nossa casa, rouba-nos a lua e, conhecendo o nosso medo, arranca-nos a voz da garganta. E porque não dissemos nada, já não podemos dizer nada.” E antes que me chamem de chata, vou avisando: Desculpa aí o mal jeito, eu sei que é Carnaval, mas não estou no clima. Quanto a você, cuide-se!
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