Milton Cunha: Dona Zica, centenário Ashanti
Desta linhagem nasceu Eusébia, afilhada de Cabocla e filha de Gertrudes. Nomes engraçados para o fogo da resistência que ardia naqueles peitos chamados Ashanti (mulher forte da África). Por isso a madrinha trocou rapidamente o nome de Eusébia pelo título de nobreza “Zica”, segurou o cajado das candaces e bateu na têmpora da negrinha, exclamando: “Vai Zica, vai ser referência de vida...”
Um dia foi ao baile e Cartola encontrou seu sapatinho de palha da costa: o príncipe era músico perturbado pela exclusão social, e cabia à Cinderela segurar o tranco do mágico compositor, porque a Estação Primeira era o palácio festivo da dupla predestinada. Germinal do samba, síntese da realeza; que recebeu nos salões do Zicartola toda a corte de bambas do ziriguidum, em noites memoráveis.
O grito fino da Deusa quando saía o resultado dos Desfiles. O lenço brilhoso amarrado sobre os brancos cabelos. Os peripaques, os arroubos de amor em feijoada verde e rosa. Uma energia de liderança de negras mulheres sambistas, que paira sobre o breque e o rufar dos tambores, tanto na velha África quanto na Sapucaí. Agora que se aproxima o centenário de nascimento da nobre Zica, percebo que ela refez em sua existência toda a trajetória incansável da diáspora, que trouxe o mistério da eterna superação para as verdejantes colinas da Guanabara.
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