Rio -  A obsessão dos estados não produtores pelos royalties de petróleo guarda semelhança com a cobiça em torno do anel da trilogia ‘Senhor dos Anéis’. Para protegê-lo, Sméagol mata o melhor amigo, se isola e se torna a mais feia das criaturas. No filme, o anel passa para as mãos do hobbit Frodo, e ele enfrenta uma saga para não deixá-lo cair nas mãos do mal. Numa cena, o anel fica num círculo formado pelas mais diversas criaturas. Até as que eram do bem passam a cobiçá-lo com olhos do mal.
Na história que se trava no Congresso desde 2010, o anel são os royalties. Em nome dele, escreveram cenas de ficção política. Passaram por cima dos contratos firmados, do Pacto Federativo, da Constituição, da solidariedade que se deve reger uma federação de estados irmãos.
No filme, o anel tem o poder de cegar. Na vida real, os royalties também. Foi preciso que a voz da razão viesse através da intervenção do Judiciário, impedindo que nosso Parlamento, num momento em que se transformou na mais bizarra das criaturas, votasse em um só dia mais de 3 mil vetos, alguns deles engavetados há anos, só para colocar as mãos naquele que lhe interessava.
Uma insanidade coletiva que revela a total ausência de escrúpulos e uma ambição capaz de qualquer coisa, inclusive prejudicar estados irmãos em minoria, produtores de petróleo, retirando deles recursos que existem para compensá-los por tudo de ruim que essa indústria extrativista e finita por natureza provoca.
As tragédias ambientais e o aumento da população nas cidades produtoras e sua consequente demanda por serviços públicos são apenas a parte mais visível disso.
Sméagol é, na verdade, uma criatura frágil. Ele se esconde nas sombras para defender um objeto inanimado que o encantou pelo brilho. Ao colocar os royalties na frente de tudo e todos, o Congresso se fragiliza porque faz isso mesmo sabendo que a decisão final, inevitavelmente, será do Judiciário. Será o preço da cegueira provocada pelo brilho de um anel feito de ouro negro.
Jornalista, secretária-geral do Fórum de Desenvolvimento Estratégico do Estado do Rio de Janeiro