Rio -  Produzido em meio às investigações sobre o escândalo envolvendo fraude milionária na Refinaria de Manguinhos contra o estado, um relatório de inteligência, atribuído à Delegacia Fazendária, faz graves acusações ao ex-chefe do Ministério Público (MP) Cláudio Lopes. No documento, ao qual O DIA teve acesso, Lopes é apontado como o responsável pelo vazamento de informações para um dos investigados no esquema, o deputado federal Eduardo Cunha, do PMDB. As 35 páginas, com escutas telefônicas, monitoramento de Cunha e referência a um senador, podem colocar em xeque a credibilidade do Ministério Público.
Eduardo Cunha, segundo o relatório, teria parado de usar linha de telefone, após reunião no gabinete do MP | Foto: ABr
Eduardo Cunha, segundo o relatório, teria parado de usar linha de telefone, após reunião no gabinete do MP | Foto: ABr
LIGAÇÕES INTERROMPIDAS
O texto diz que no dia 21 de setembro de 2009, o inquérito 688/2009 foi requisitado pelo promotor David Farias, por determinação de Lopes. No mesmo dia, Cunha teria falado, por telefone com o então procurador e depois participado de reunião com ele no gabinete do MP. A partir daí, os alvos da investigação — entre eles o empresário Ricardo Magro, da refinaria, e Cunha — pararam de falar pelos telefones. Magro estava com aparelho grampeado com autorização da 20ª Vara Criminal.
Lopes admite que o processo esteve em seu gabinete, que tratava com o deputadoassuntos institucionais e falou com ele pelo menos quatro vezes ao telefone no período que esteve à frente do MP. “Repudio insinuação de que possa ter passado informações sigilosas para quem quer que seja. Não tenho relação com o Eduardo Cunha”, disse.
O procurador levantou a suspeita de o vazamento ter sido feito pela Polícia Civil. “Não sou leviano, mas é uma possibilidade”, afirmou. Acredita que oportunistas podem ter se aproveitado do momento em que o inquérito foi encaminhado ao promotor David Farias. David não se pronunciou.
O relatório tem data de 15 de outubro de 2010, destinado à 20ª Vara Criminal, com carimbo da delegada Valéria Aragão e suposta assinatura dela, à época na Fazendária. “Não fiz relatório de inteligência. Desconheço o documento”, alegou a delegada. A juíza Maria Eliza Peixoto Lubanco não falou sobre o caso. Ontem, em sua página na internet, Cunha alegou que seu nome não era mencionado na investigação. A chefe de Polícia Civil, Martha Rocha, requisitou que Ângelo Ribeiro, da Delegacia Fazendária, investigue a veracidade do relatório.
Denúncia no MP Federal há um mês
O procurador-geral de Justiça, Marfan Vieira, informou ontem que há um mês, quando tomou conhecimento sobre suposto vazamento de informação e escutas telefônicas do inquérito sobre a refinaria encaminhou o caso ao procurador-geral da República, Roberto Gurgel, para a investigação dos fatos.
Em nota oficial, o chefe do Ministério Público ressaltou ainda que “como as notícias envolvem, além do ex-chefe do MP no Rio, um deputado federal, a atribuição para a apuração desse caso é do Supremo Tribunal Federal, através do procurador-geral da República”, explicou trecho da nota.
Investigação foi iniciada em 2009
A investigação da Fazendária começou em 2009 para apurar fraude tributária milionária na refinaria. Com a identificação do deputado Eduardo Cunha, o caso saiu da 20ª Vara Criminal e foi para Supremo Tribunal Federal.
Há outros quatro investigados, entre eles Ricardo Magro e Marcelo Sereno, envolvido no Mensalão, e secretário de Desenvolvimento Econômico, Indústria, Comércio e Petróleo de Maricá. Sereno teria comandado a refinaria em 2009.
No ano passado, o governador Sérgio Cabral decidiu desapropriar a refinaria. Cobrava R$ 675 milhões de ICMS.
Lopes: “Honra é algo muito sério. Tudo isso parece uma grande armação”
O ex-procurador-geral de Justiça Cláudio Lopes faz questão de ressaltar que no passado foi procurado por Eduardo Cunha sobre investigação de uso de documento falso no Tribunal de Contas do Estado. Em 2002, o TCE investigava possíveis irregularidades em licitação da Companhia de Habitação Fluminense (Cehab), que foi presidida por Cunha entre 1999 e 2000.
“O problema envolvia o procurador Fishberg, que, posteriormente, remeteu peças ao Supremo que, pelo visto, resultou em recente ação penal contra o deputado”, disse. Lopes se referia a Elio Fischberg. No ano passado, o Tribunal de Justiça o condenou por falsificação de documento público e à perda do cargo. “Jamais daria informações sigilosas a ninguém. Não sou louco!”, esbravejou Cláudio Lopes.
Ele ressaltou que tem 25 anos de Ministério Público e foi procurador-geral duas vezes. “Honra é algo muito sério. Tudo isso parece uma grande armação. Vou tomar providências na esfera cível e criminal”, anunciou Lopes.
Relatório detalha a mudança de postura dos investigados
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