Rio -  Nos últimos 20 anos, 96 milhões de pessoas foram afetadas por catástrofes naturais no Brasil, incluindo secas e enchentes. Só na Região Serrana, os temporais mataram 1.500 moradores. O levantamento do Centro de Estudos e Pesquisas em Emergências e Desastres da Fiocruz mostra outro dado preocupante: 90% dos recursos da Defesa Civil no país foram gastos no socorro às vítimas e apenas 10%, na prevenção. A situação é ainda mais grave no Estado do Rio. Segundo a pesquisa Perfil dos Municípios Brasileiros, divulgado pelo IBGE, dos 92 municípios fluminenses, 75 não têm plano municipal de redução de riscos. Destes, somente 36 estão elaborando o plano, como Angra dos Reis, Niterói, Magé e Volta Redonda. Chuva na tarde de ontem alagou ruas. Sirenes soaram em Teresópolis e Nova Friburgo.
Forte chuva causou deslizamentos no bairro turístico Quitandinha domingo passado | Foto: Fernando Souza / Agência O Dia
Forte chuva causou deslizamentos no bairro turístico Quitandinha domingo passado | Foto: Fernando Souza / Agência O Dia
“O Brasil não tem cultura de investir na prevenção de desastres e doenças. Estamos sempre apagando incêndios”, avalia o professor Carlos Machado, da Escola Nacional de Saúde Pública da Fiocruz, que coordenou o estudo. O pesquisador explica que não adianta implantar sirenes sem investir em saneamento, contenção de encostas, drenagem de rios e construção de moradias.
Para o desembargador Cláudio dell’Orto, presidente da Associação dos Magistrados do Estado, há um descaso histórico do poder público. “Não são problemas inéditos ou imprevisíveis”, critica.
Foto: Arte: O Dia
Arte: O Dia
Ações que poderiam ter evitado o sofrimento do faxineiro Magno Mendes, 63. Abalado pela perda da casa em 1981, em Petrópolis, ele se mudou para a casa do sogro em Macaé, com esposa e três filhos. Em 95, de volta à terra, perdeu o filho de 9 anos e, de novo, a casa. “Minha esposa me culpou, pediu o divórcio e se mudou com os dois para Belo Horizonte”, conta Magno. Ele passou a morar de favor, com um amigo, no Quitandinha. Na nova tragédia, árvore atingiu o imóvel, que foi condenado. O prefeito Rubens Bomtempo não vê solução: “Estou dialogando com os governos estadual e federal para ter política pública efetiva”.
Drama que passa de pai para filho: três gerações vítimas
Três gerações vítimas de um descaso que já dura 30 anos. “Não é possível que um problema tão recorrente não tenha recebido uma atenção especial. Até quando?”, questiona a aposentada por invalidez Tereza da Silva Seabra, de 55 anos. Em 1981, aos 24 anos, ela perdeu os pais na enchente que castigou Petrópolis. Os corpos nunca foram encontrados.
Traumatizada, vendeu o antigo imóvel da família e comprou outro no bairro da Independência. Em 1995, um novo temporal provocou deslizamentos. A casa de Dona Terezinha foi condenada pela Defesa Civil. “Era o único patrimônio que eu tinha, sozinha no mundo com uma criança de colo”, recorda.
O primeiro aluguel social foi pago em setembro, 12 anos após a tragédia. No último domingo, além de sofrer a perda de vizinhos e amigos, viveu uma nova angústia.
“A casa da minha filha está cheia de rachaduras, e ela não poderá ficar. Não queria que ela passasse por isso também. Primeiro meus pais, depois eu, e agora minha filha. Será que a minha neta também passará por isso?”, desabafa.
Disciplina Defesa Civil nas escolas
Alunos de escolas municipais do Rio vão aprender noções de primeiros socorros, prevenção de acidentes domésticos e como se proteger de desastres naturais. A partir de amanhã, a disciplina Defesa Civil, baseada na Lei Federal 12.608, fará parte da grade escolar de 2.500 estudantes do 5º ano em 38 unidades da rede.
No fim do ano, os alunos farão exercício simulado para aplicar na prática o que aprenderam. “As sirenes vão tocar e eles vão participar de toda a ação de retirada das famílias para os abrigos”, explica Marcus Belchior, secretário municipal de Conservação e Serviços Públicos.
A meta é levar a disciplina a 35% da rede até 2016. “Países desenvolvidos já fazem esse trabalho de prevenção nas escolas. As crianças aprendem e ensinam seus familiares”, diz o secretário. A aula inaugural será amanhã, às 9h, no Ciep Dr. Antoine Magarinos Torres Filho, no Borel, Tijuca.