Jaguar: O carioca mudou?
Botecos e barbearias são cada vez mais raros no Leblon, e a imponderável leveza do humor carioca se desfaz como fumaça de cigarro, agora banido
Rio - Ou mudei eu? Em papo de boteco e barbearia sempre tinha alguém contando a última piada (de português, de sogra, de corno, de caipira) e se falava de mulher, futebol, comida, bebida e (mal) do governo. O pessoal se referia ao governo, não importava de que partido, como “eles”. Tipo “Eles não tapam os buracos”.
Botecos e barbearias são cada vez mais raros no Leblon, e a imponderável leveza do humor carioca se desfaz como fumaça de cigarro, agora banido. A barra tá pesando, o bicho tá pegando. Não é birra de velho, ou tio, em língua de pivete. Na edição de quinta passada deste jornal, duas notícias até então inimagináveis. A primeira: “Carioca mal em teste de honestidade com 16 cidades”. Ficamos na parte de baixo da tabela, em 12º lugar, um vexame. O consolo é que nossa avozinha, Lisboa, ficou em último (depois de tanto tempo, finalmente uma piada de português). A segunda notícia: “Rio acima da média nacional na violência contra a mulher”. Logo a mulher! Imagina Vinicius lendo isso.
Lembrei de barbearia porque fui dar uma aparada no meu cavanhaque ali na Ataulfo de Paiva quando o horror chegou pelo telefone. Alguém ligou para avisar da tragédia do diagramador (agora chamam de designer) que matou a mulher e a filha a facadas e se suicidou. Era freguês do meu barbeiro. Pensar que uma semana antes estava sentado na mesma poltrona que eu. Voltei para casa com meia barba por fazer. É assustador quando uma coisa dessas acontece próxima de nós.
Conheço de vista o pai do protagonista da tragédia, também frequenta o mesmo barbeiro, tem mais ou menos minha idade. Nunca imaginei passar por isso: eu, carioca da Cruz Vermelha, com medo de andar à noite pela cidade. Outro dia Célia e eu fomos jantar fora; quando voltamos, as ruas estavam desertas, a gente não ousava parar em sinal fechado. Há uns dez anos era hora de sair para a boemia (apaulistaram para — argh! — balada).
Em geral o rolê acabava com o sol nascendo, sem a menor sensação de perigo. E até o senso de humor do carioca anda rateando. Tive que explicar a um leitor que a minha última charge não era contra Sérgio Cabral, mas contra os que acampavam na rua onde mora com a família. Os vizinhos não têm nada a ver com isso. Não é coisa de carioca. Protesto contra o governo é na frente do Palácio.
Botecos e barbearias são cada vez mais raros no Leblon, e a imponderável leveza do humor carioca se desfaz como fumaça de cigarro, agora banido. A barra tá pesando, o bicho tá pegando. Não é birra de velho, ou tio, em língua de pivete. Na edição de quinta passada deste jornal, duas notícias até então inimagináveis. A primeira: “Carioca mal em teste de honestidade com 16 cidades”. Ficamos na parte de baixo da tabela, em 12º lugar, um vexame. O consolo é que nossa avozinha, Lisboa, ficou em último (depois de tanto tempo, finalmente uma piada de português). A segunda notícia: “Rio acima da média nacional na violência contra a mulher”. Logo a mulher! Imagina Vinicius lendo isso.
Lembrei de barbearia porque fui dar uma aparada no meu cavanhaque ali na Ataulfo de Paiva quando o horror chegou pelo telefone. Alguém ligou para avisar da tragédia do diagramador (agora chamam de designer) que matou a mulher e a filha a facadas e se suicidou. Era freguês do meu barbeiro. Pensar que uma semana antes estava sentado na mesma poltrona que eu. Voltei para casa com meia barba por fazer. É assustador quando uma coisa dessas acontece próxima de nós.
Conheço de vista o pai do protagonista da tragédia, também frequenta o mesmo barbeiro, tem mais ou menos minha idade. Nunca imaginei passar por isso: eu, carioca da Cruz Vermelha, com medo de andar à noite pela cidade. Outro dia Célia e eu fomos jantar fora; quando voltamos, as ruas estavam desertas, a gente não ousava parar em sinal fechado. Há uns dez anos era hora de sair para a boemia (apaulistaram para — argh! — balada).
Em geral o rolê acabava com o sol nascendo, sem a menor sensação de perigo. E até o senso de humor do carioca anda rateando. Tive que explicar a um leitor que a minha última charge não era contra Sérgio Cabral, mas contra os que acampavam na rua onde mora com a família. Os vizinhos não têm nada a ver com isso. Não é coisa de carioca. Protesto contra o governo é na frente do Palácio.
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