Rio -  Humanos ou objetos? Como vivemos e nos comportamos nos relacionamentos? Pergunta complicada. Resposta, nem tanto. Viver como objeto é seguir sempre igual, previsível e repetitivo. Já nas relações com o outro, transformamos pessoas em objetos que podem ser necessários ou não e, como tal, descartáveis. Seres transformados praticamente em utensílios a serviço de necessidades e interesses pessoais.
Viver como coisa no mundo denuncia certa inveja dos objetos, melhor, da estabilidade deles. Quase queremos ser como coisa, sempre estáveis e iguais. Ao que tudo indica, sentimos um fascínio por esta condição e esquecemos que somos humanos, instáveis, mutáveis, diferentes. Nunca somos isso ou aquilo. Existimos das mais diversas formas, fato que nos diferencia dos objetos que são série sucessiva e igual de aparições, com a finalidade de nos servir e não de nos escravizar.
Focando nos relacionamentos humanos, percebemos uma desvalorização do afeto em detrimento do objeto! A geração shopping center, da compulsão insaciável de tudo ter, vive um esvaziamento do humano. Querem o corpo bonito transformado em objeto, o cabelo louro e liso, o último celular, o novo modelo de carro e tantas outras coisas sem as quais não se pode ser feliz.
Assim, muitos vivem focados nos objetos, desejando ser como eles, e não existindo sem eles. O desejo se tornou vítima do capital, foi capturado, é desejo de objeto: consumo. Onde ficam os prazeres da existência sem abrir a carteira? Complicado. Sair de casa custa dinheiro, não tê-lo, produz solidão, exclusão.
As relações humanas passaram a ser objetais. Somos descartados quando não mais necessários. Pessoas usam as outras e desenvolvem uma relação utilitarista. Na condição de objetos, somos como o casaco indispensável no inverno, mas descartado no verão. Necessários ou não em determinados períodos da vida, num oportunismo circulante impossível de não ser percebido.

Cruel. Pessoas consomem pessoas por conta de seus interesses. Valemos o que possuímos ou o que podemos patrocinar com o que temos. Qualidades humanas, como solidariedade, afeto, generosidade e aquele velho amor ao próximo, que não são mercadorias compráveis, estão em baixa. Vivemos esses tempos de capitalismo com a subjetividade empobrecida e a realidade humana contaminada pela incontrolável vontade de tudo possuir, que, creio, é irreversível. Lamentável.
Fernando Scarpa é psicanalista