Rio -  A imagem em preto e branco traduz em tortos dribles a linha reta da chuva carioca.
Sim, nossas tempestades me remetem a Garrincha, o gênio da bola.
O adversário conhece a manha do ponteiro — vai pra direita, eu sei — parte determinado e... leva nas costas. Um lance repetido em duas Copas e por seguidos anos alvinegros em gramados cariocas.
As chuvas nessa cidade tem obviedade do Mané, uma crônica reescrita a cada trovoada anunciada nos dias de verão.
Outro craque da gema, Moreira da Silva, lançou em 1959, passa de 50 anos, um samba chamado ‘Cidade Lagoa’ com versos que parecem inspirados nesta semana:
Basta que chova mais ou menos meia hora
É batata, não demora
Enche tudo por aí
Toda cidade é uma enorme cachoeira
Que da Praça da Bandeira
Vou de lancha a Catumbi
Outro dia assisti no YouTube um vídeo onde um gaiato surfava na Rua Marques de São Vicente, Gávea, com evoluções de um profissional em Honolulu.
Ouço dizer que terremoto no Japão é feito encosta de Friburgo, cai toda hora. Os caras pintadas do sol nascente cuidaram de erguer prédios e viadutos moldados em estruturas que suportem essas ondas sísmicas.
Aqui, personagens de um seriado vintage, o Rio Maracanã transborda desde que o Conde de Bonfim ainda era brigadeiro e o estádio de mesmo nome, um derby de cavalos velozes.
Ponto de referência, o casal de namorados combina por celular: “Amor, me encontra na Lagoa, ali na curva da enchente, isso, em frente a árvore que vai tombar”.
Privilégios da vida, estava num almoço concorrido em boa conversa, quando o mestre Millôr Fernandes fala em volume médio: “Eu gostaria de conhecer Paraty”. Alguém interrompe: “Mas você não esteve lá, semana passada?” “ Sim, olhando só pra baixo pra não torcer o tornozelo nas pedras do calçamento”.
Um dia após o caos pluviométrico, reparo a cidade assustada. Alguém tossiu na Rua do Catete e todos em voltam apontaram pro alto no desespero das galochas, um Gene Kelly descompassado.
Espero o dia em que olhar pro céu seja apenas pra ver o sol trazer bom dia como a bela canção de Cartola e Dalmo Castelo.
Em tempo: Aprendi os acordes de ‘Cidade Lagoa’ com o querido amigo Jards Macalé, o mais novo setentão da praça.