Rio -  À primeira vista, a nova Escola Municipal Tasso da Silveira, em Realengo, na Zona Oeste, impressiona pela estrutura moderna e os espaços criados para o aprendizado e entretenimento dos estudantes. Porém, atrás das grades que tomaram o lugar do muro, o medo continua presente. Dois anos após o massacre que deixou 12 alunos mortos e outros 12 machucados, a ferida da barbárie não cicatrizou.
Depois que Wellington Menezes de Oliveira, 23 anos, invadiu a unidade com duas armas e abriu fogo contra turmas do 8º ano, funcionários e pais de alunos ainda se assustam com a aproximação de estranhos. 
Fachada da Tasso da Silveira, que recebeu várias melhorias após o crime, em 7 de abril de 2011: além dos mortos, outros 12 alunos foram baleados | Foto: Maíra Coelho / Agência O Dia
Fachada da Tasso da Silveira, que recebeu várias melhorias após o crime, em 7 de abril de 2011: além dos mortos, outros 12 alunos foram baleados | Foto: Maíra Coelho / Agência O Dia
Apesar das câmeras e seguranças colocados no pátio da unidade, a presença de desconhecidos — como a equipe do DIA, que fotografou a escola esta semana — é motivo para os alunos se assustarem.
Com a reforma, as salas que foram cenário da tragédia deixaram de existir. Mas a lembrança de quem estava lá não se foi junto com paredes.
“Estou um pouquinho melhor, mas esquecer é impossível. Tento viver de forma que amenize um pouco, que me ocupe bastante o tempo e a cabeça. Mas ainda acordo gritando à noite, vendo o atirador com as armas, vindo na minha direção”, relata Matheus Vilhena, 15. Ele levou três tiros no braço e no peito, fez vária cirurgias e ainda está em tratamento para se recuperar das dores que ainda sente e diz que tem dificuldades para segurar objetos.
Cruz no local onde Wellington foi enterrado caiu e nunca foi recolocada | Foto: Fernando Souza / Agência
Cruz no local onde Wellington foi enterrado caiu e nunca foi recolocada | Foto: Fernando Souza / Agência
Apesar do tratamento psicológico, o adolescente ainda lembra dos momentos de pânico quando, mesmo ferido, tentou proteger a amiga Larissa, que morreu no tiroteio.
“Eu ainda tenho medo do Wellington. Vejo o rosto dele e acordo gritando e chorando. No início, nem conseguia sair de casa sozinho. Tentei retomar os estudos várias vezes, mas desmaiei de pânico e desisti”, relata o adolescente, que mudou de escola.
Hoje haverá missa na Igreja N.S. de Fátima João de Deus, às 9h30, em homenagem às vítimas. A igreja fica na Av. Marechal Nogueira de Sá 1.421, em Realengo. À tarde, familiares dos jovens vão sair em carreata até a escola, pedindo paz e o desarmamento das pessoas.
Funcionário e visitante só com crachá
A Secretaria Municipal de Educação informou que há porteiro 24 horas na unidade e que funcionários e visitantes são identificados através de crachás. Além disso, alega que os estudantes ainda recebem apoio psicológico, pedagógico e de assistentes sociais.
prefeitura informa ainda que 268 alunos deixaram a Tasso da Silveira nos últimos dois anos. A escola tem lista de espera por vagas para 2013, mas apesar das melhorias, outros estudantes que passaram pelo trauma, como Matheus, preferiram seguir outros caminhos.
Jade Ramos, 14 anos, foi uma das que pediram para mudar de escola. Na época da tragédia, a sobrevivente emocionou o Rio com a carta em agradecimento ao sargento Márcio Alves pelas vidas que ele salvou.
“Ela não conseguia voltar ao colégio, chorava só de passar na rua. Por isso, resolvi tirá-la”, disse a mãe da menina, Lúcia Ramos.
PARA SEMPRE, O GRANDE HERÓI
Considerado por famílias de vítimas o herói da Tasso da Silveira, o sargento PM Márcio Alves ainda mantém contato com muitas delas. O militar foi o primeiro a entrar na escola no dia do massacre e deu o tiro que parou Wellington, que depois se suicidou. Foi convidado pelos sobreviventes que se formaram no ano passado a discursar na formatura. Para ele, a lembrança da tragédia também está viva.
Sobrevivente, Jade Ramos fez questão de abraçar o PM Alves | Foto: Alexandre Brum / Agência O Dia
Sobrevivente, Jade Ramos fez questão de abraçar o PM Alves | Foto: Alexandre Brum / Agência O Dia
“Ainda mantenho contato com eles, vou participar de uma das homenagens no domingo (hoje). Pensei que, depois da formatura das crianças, estaria com a minha missão ali cumprida, mas vejo que não. Não consigo me afastar deles e ainda sou reconhecido pelas pessoas nas ruas. O que puder fazer para ajudá-los, estarei sempre à disposição. Sou pai também e assumi um pouco da responsabilidade por essas vidas que ajudei”, disse.
Dois anos depois de tirar a vida de 12 inocentes e a sua própria, Wellington foi abandonado até por sua família. O túmulo dele, no Cemitério do Caju, está destruído. A cruz onde está o número de identificação, caiu e nunca foi recolocada.
“Nenhum parente nunca veio aqui visitar. Somente umas pessoas que fizeram um trabalho espiritual no dia do enterro, mas não voltaram mais. Os alguidares (vasos) deixados estão cheios de lama e lodo. É horrível um ser humano ser tão desprezível, a ponto de ninguém nem pedir por sua alma, nem se lembrar dele. É o preço pela dor que ele fez tanta gente sentir”, acredita um dos coveiros, que pediu anonimato.