Moacyr Luz: Intimidades
'É o cotidiano falando contigo por mensagem direta'
Rio - Você atende o telefone e, do outro lado, uma voz impessoal atropela o cordial “alô” soletrando seu nome completo. Pronto, trata-se de um anúncio de banco, um trote permitido e antipático repetido ao longo do dia. Ultimamente o telefone mal sai do gancho quando, esguichando gritos de locutor de supermercado, ofertas entram no seu aurícolo preferido, agudos em invasão de privacidade. A cena é doméstica, quarto e sala do seu cotidiano. Com o celular, o trinado vem em forma de torpedo: consegue te achar até debaixo da cama, um tiro digno dos quadrados da Batalha Naval. O alerta, cercado de códigos, quer a tua participação em sorteios diversos, carros e motos pra um sujeito que não suporta dirigir. Ando impressionado com essas intimidades.
No Rio, um sujeito quer ser gentil e convida:
— Aparece lá em casa!
A leitura é simples: “Jamais o visite”. Existe um limite nos relacionamentos.
Numa dessas tardes, silêncio e mesa de bar, um gaiato se aproxima, elogia e garfa o provolone que tira o gosto da tua bebida, cheira a rolha do teu vinho e, notando um volume no bolso da camisa, aponta:
— Posso fumar um dos seus cigarros?
— Eu não fumo! Isso aqui é colírio, meu chapa...
— Beleza! Aplica no meu olho que a poluição vem matando.
O garçom traz o couvert. Cenoura crua cortada em tiras, ovo de codorna com casca e azeitona caprichada no sal. A torrada é caseira pra você usar com a bolinha gelada de manteiga sem marca. O problema só aparece na conta: é cobrado.
É o cotidiano falando contigo por mensagem direta.
Tenho amigos taxistas. Quando é madrugada, no Lamas, torço pra encontrar o Betinho na saída. As idas diurnas, bandeira um, divido com dois ases, Nonno e Fernando. Em comum, todos têm seus rádios em volume razoável e a programação digna de um ser humano lúcido. Nem sempre dou sorte na agenda desses condutores e aí, surge o autônomo amarelinho, na leitura adjetiva. Alguns tem uma minitevê, antenas-antílopes, mas as imagens tremidas na vertical com pastores e músicas religiosas, catarses de fé, ou, novelas de estranhos atores em evidência. No dial da rádio, um repertório mais apropriado à bailes populares, raves enlouquecidas aonde nem se cogita um itinerário, um destino, uma razão de ir.
Confesso que, no fundo, me agrada um certo tête-à-tête. Às vezes, o vinho te deixa mais baco que devia, o violão nas costas pesa feito piano, você encosta na entrada do prédio e o porteiro, atento, percebe a necessária ajuda pra se alcançar o elevador. Feito motorista de ônibus, os cumprimentos se restringem somente ao indispensável, te salvando de um tropeço nas mínimas palavras.
Cá pra nós, ônus necessário, existe vida após o convívio, basta você adicionar essa questão no seu status da linha do tempo, uma notificação aberta.
No Rio, um sujeito quer ser gentil e convida:
— Aparece lá em casa!
A leitura é simples: “Jamais o visite”. Existe um limite nos relacionamentos.
Numa dessas tardes, silêncio e mesa de bar, um gaiato se aproxima, elogia e garfa o provolone que tira o gosto da tua bebida, cheira a rolha do teu vinho e, notando um volume no bolso da camisa, aponta:
— Posso fumar um dos seus cigarros?
— Eu não fumo! Isso aqui é colírio, meu chapa...
— Beleza! Aplica no meu olho que a poluição vem matando.
O garçom traz o couvert. Cenoura crua cortada em tiras, ovo de codorna com casca e azeitona caprichada no sal. A torrada é caseira pra você usar com a bolinha gelada de manteiga sem marca. O problema só aparece na conta: é cobrado.
É o cotidiano falando contigo por mensagem direta.
Tenho amigos taxistas. Quando é madrugada, no Lamas, torço pra encontrar o Betinho na saída. As idas diurnas, bandeira um, divido com dois ases, Nonno e Fernando. Em comum, todos têm seus rádios em volume razoável e a programação digna de um ser humano lúcido. Nem sempre dou sorte na agenda desses condutores e aí, surge o autônomo amarelinho, na leitura adjetiva. Alguns tem uma minitevê, antenas-antílopes, mas as imagens tremidas na vertical com pastores e músicas religiosas, catarses de fé, ou, novelas de estranhos atores em evidência. No dial da rádio, um repertório mais apropriado à bailes populares, raves enlouquecidas aonde nem se cogita um itinerário, um destino, uma razão de ir.
Confesso que, no fundo, me agrada um certo tête-à-tête. Às vezes, o vinho te deixa mais baco que devia, o violão nas costas pesa feito piano, você encosta na entrada do prédio e o porteiro, atento, percebe a necessária ajuda pra se alcançar o elevador. Feito motorista de ônibus, os cumprimentos se restringem somente ao indispensável, te salvando de um tropeço nas mínimas palavras.
Cá pra nós, ônus necessário, existe vida após o convívio, basta você adicionar essa questão no seu status da linha do tempo, uma notificação aberta.
Nenhum comentário:
Postar um comentário