Rio -  Eram 10 horas da manhã de 30 de abril de 1854. A Praia de Mauá, no fundo da Baía da Guanabara, estava em festa. Inaugurava-se a primeira estrada de ferro do Brasil. Sua Majestade, Dom Pedro II, que nascera em dezembro de 1826, contava, a esta época, 29 anos incompletos. O empresário e empreendedor Irineu Evangelista de Souza era de 1813 e fazia 40 anos. Entre ambos havia um abismo e o que os separavam eram as visões que tinham a respeito do mundo em que viviam.
Foto: Reprodução Internet
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D. Pedro II foi educado para carregar uma coroa na cabeça e não permitir que avanços demasiados nas ações da burguesia liberal progressista se chocasse com os interesses da nobreza, representada pelo Partido Conservador.
O autor do pequeno trecho de estrada de ferro que ligava a Praia de Mauá a Fragoso, no pé da serra, no caminho para Petrópolis, chamava-se Irineu Evangelista de Souza. Era uma figura ímpar no seu tempo, um homem simples que nascera de família humilde em Arroio Grande, no Rio Grande do Sul. Ele havia começado sua vida como balconista e caixeiro numa empresa comercial de ingleses no Rio de Janeiro. Com a volta de seus patrões para a Inglaterra, a firma lhe foi entregue pelos seus méritos pessoais.
Nesta época faz uma visita a Inglaterra e se empolga com o crescimento industrial daquele país. No seu retorno ao Brasil, Irineu não era o mesmo. Sua cabeça e suas idéias são de um homem empreendedor. No discurso de inauguração, Irineu proferiu um contundente discurso frente ao Imperador Pedro II, e inicia dizendo “Senhor! A Diretoria da Cia. de Navegação à Vapor e Estrada de Ferro Petrópolis vem render graças à Vossa Majestade pela honra que se dignaram conferir à estrada, vindo assistir à solenidade de sua inauguração”.
Naquela manhã de 30 de abril de 1854, não estava somente o imperador. Estava ali também a nobreza do Império com seus condes, condessas, viscondes, barões e duques, além de jornalistas e intelectuais do Império. O fato era único na história do Brasil. Estava nascendo ali uma revolução nos meios de transporte de longa distância.
Irineu ainda diz: “Hoje, dignam-se Vossas Majestades de vir ver correr a locomotiva veloz, cujo sibilo agudo ecoará nas matas do Brasil prosperidade e civilização, e marcará, sem dúvida uma nova era para o País”.
Irineu pede a proteção do Imperador nos novos empreendimentos. Era o seu sonho chegar com a locomotiva às margens do Rio das Velhas, no interior de Minas Gerais, escoando a produção das terras contíguas ao Rio São Francisco, fazendo chegar à capital do Império e transformando o Rio de Janeiro na mais próspera cidade do continente americano.
Na visão conservadora, Irineu Evangelista era um visionário, com sonhos mirabolantes e longe da realidade. Quatro anos depois, saindo da Estação da Proclamação, com direção à localidade de Maxambomba e Queimados, Cristiano Ottoni e toda a comitiva liderada por D. Pedro II e Dona Thereza Cristina, inaugurava-se a Estrada de Ferro D. Pedro II. Por onde passava era ovacionado pelas lideranças locais e políticas do Império.
É verdade que a locomotiva consumia madeira, que acelerava o processo de desmatamento, destruindo as florestas da Baixada e promovendo um grande desequilíbrio ecológico regional. É o preço que pagamos pelo progresso, com tecnologias iniciadas na Revolução Industrial Inglesa do século XVIII. Ao início do século XX, a Baixada já não era mais a mesma.